Douglas Reis
Fonte - http://questaodeconfianca.blogspot.com.br/2014/0
COMPRE AGORA O SEU ADVENTISMO PASTEURIZADO, ESTÁ EM PROMOÇÃO - parte 2
Não deixe de ler a primeira parte. publicada neste blog
Indubitavelmente,
há espaço para diversas contribuições sobre as questões relativas à situação do
adventismo. Em virtude de nosso espaço limitado, sugiro algumas linhas de ação
para revitalizar o adventismo:
• Adoção
de uma hermenêutica biblicamente sadia como condição preliminar para
Reavivamento e Reforma (RR): A crise de identidade adventista possui
diversas causas, todavia sua causa mais elementar é de natureza espiritual.
Reconhecer a Deus como solução não é superficializar o problema, mas lançar mão
do poder acima das limitações e hesitações humanas. Por isso, não se deve considerar
RR um programa denominacional; trata-se de um chamado à vida, por meio de uma
ligação com a sua fonte, Deus e Sua Palavra (Jo 15:7). Tal ligação inicial
permitiu ao adventismo veicular sua base à Bíblia somente, adotando uma
perspectiva profética. Os pioneiros construíram progressivamente sua
hermenêutica, a qual dependia de forma radical do texto. Ao contrário do que se
defende popularmente, voltar à Bíblia não é algo a ser reduzido ao compromisso
de ler o Livro Santo todos os dias, porque existem modelos conflitantes de se
interpretar a Bíblia (toda forma de leitura pressupõe uma interpretação). Ao
longo dos últimos três séculos, surgiram modelos de interpretação
racionalistas, que partem do pressuposto de que a Bíblia é um livro
condicionado pela cultura humana, e que os profetas tiveram uma experiência
mística não racional com Deus, expressa em termos meramente humanos. Assim, não
há nada de realmente sobrenatural na Bíblia! Mais recentemente, surgiram outros
modelos, que adotam a postura de que o significado das coisas é cambiante,
mudando a cada época. Consequentemente, o foco está no leitor, pois é ele quem
define o significado do texto para si, sendo este o único significado que se
pode de fato alcançar. Ler a Bíblia a partir destas perspectivas limitadas não
conduzirá a qualquer reavivamento e muito menos a uma reforma! Infelizmente,
ideias erradas sobre revelação e inspiração afetam o entendimento das
Escrituras e dividem os círculos adventistas eruditos há décadas (por
influência dos evangélicos liberais e neo-ortodoxos). Tais ideias se acham
popularizadas e largamente aplicadas tanto à Bíblia como aos testemunhos de
Ellen G. White. Por isso, as discussões entre adventistas, que um dia se
resolviam com um simples “Assim diz o Senhor”, atualmente não se resolvem com a
mesma facilidade. Todos recorrem à Bíblia, porém para chegar a diferentes
posições sobre o assunto. Não que a Bíblia apresente um caráter dúbio; o
problema está com as pressuposições adotadas. Enquanto tais questões dividirem
os adventistas, ler a Bíblia será parte do problema, não a solução.
Entrementes, a condição preliminar para o RR é assumir que a interpretação da
Bíblia só pode ser correta quando parte de pressupostos transmitidos pela
própria Bíblia. Dito de outra forma, depende-se de Deus até mesmo no auxílio
para interpretar Sua Palavra, por intermédio do Espírito Santo (Jo 16:13) e
seguindo o modelo presente na própria Palavra. O processo não é simples, pois
exige uma reordenação do que cremos, à medida que somos moldados pelas ideias
presentes no texto inspirado. Essa reordenação mental conduz à interpretação
correta, entendendo o que Deus disse não com a cabeça de quem vive no século
XXI, mas como Ele pretendeu que Suas palavras fossem interpretadas em qualquer
período da História. A verdade de Deus não muda em essência. Por conseguinte, é
necessário um compromisso que se traduza em obediência concreta a tudo quanto
Deus exige – o que é a verdadeira reforma. Nada menos do que santidade é
exigido de todos nós. Diante das batalhas pela interpretação correta, muitas
delas restritas aos bastidores e quase nunca enunciadas de modo esclarecedor,
torna-se inócuo ressaltar o estilo de vida adventista; ainda mais porque, sem
colocar a Bíblia no patamar que Deus pede, pouco se tem experimentado o
processo de RR que leva à obediência na prática. Crentes sem conexão com a
Palavra se sentem ofendidos pela pregação do estilo de vida, enquanto aqueles
que adotam leituras liberais da Bíblia procuram alternativas para se escusarem
de obedecer o que está incluso no mesmo estilo de vida. A melhor argumentação
bíblica não pode convencer uma geração acostumada a não pensar biblicamente,
mesmo quando lê a Bíblia. O reavivamento só ocorre quando aceitamos quem é Deus
e que Ele Se comunica pela Palavra, a qual possui preceitos normativos acima da
cultura humana, o que nos leva a reavaliar e descartar ideias herdadas das
diversas tradições humanas e mesmo o que a experiência nos ensina;
• Integração
da fé bíblica com a experiência de forma relevante em um contexto secular:
Há mais de meio século, o Ocidente vive um processo de secularização
responsável pelo enfraquecimento da religião como referência para as diversas
áreas da vida. Pessoas religiosas sofrem os efeitos disso; sempre se corre o
risco de compartimentalizar a experiência cristã, limitando-a ao mero
conhecimento bíblico dissociado do cotidiano ou simplesmente como algo místico,
capaz de proporcionar êxtase emocional. Entretanto, o adventismo surgiu como
uma espiritualidade prática, não desvinculada das demandas intelectuais ou
exigências práticas do mundo real. Por isso, o adventismo propôs um sistema
educacional diferenciado, adotou uma dieta saudável, incentivou evangelismo via
colportagem, preocupou-se com as relações familiares e se dispôs a enviar
missionários para o mundo. Nunca houve adventismo sem um estilo de vida
adventista. Entretanto, a onda de revisionismo pós-moderno deixou a sala de
reunião dos catedráticos para se manifestar em uma enxurrada de comentários em
fóruns pela internet, reivindicando
liberdade para construir sua própria experiência espiritual e ressignificar a
tradição religiosa. Quando isso aconteceu com cristãos tradicionais, foi
assustador; quando passou ao seio do movimento adventista, calamitoso! Que se
questione coisas básicas como criacionismo, a relevância da data de 1844 e a
importância destas coisas para o adventista hoje, é sinal de estarmos em maus
lençóis! Isso não representa um progresso no adventismo, no sentido de torna-lo
relevante ao mundo secular pós-moderno. Relevância implica em traduzir algo
para um contexto diferente, tornando-o compreensível, mas sem alterar sua
essência. A forma como relevância se tornou um paradigma para a evangelização
leva ao risco da assimilação. Assimilação é a adaptação de algo a conceitos
alheios à sua natureza, alterando a sua essência. Muitos ardorosos defensores
do evangelismo relevante se tornam, na prática, promotores do evangelho
assimilado pela cultura contemporânea. O adventismo não recebeu a incumbência
de pregar um evangelho assimilado pelo mundo, mas de pregar o evangelho eterno
(Ap 14:7) buscando fazer isso de forma relevante. A pregação ao mundo (Ap 14:6)
se torna pregação contra o mundo, no sentido de anunciar um juízo universal, de
consequências eternas contra os pecadores impenitentes (Ap 14:8-11), conquanto
seja, simultaneamente, a pregação da salvação, convidando à saída de Babilônia
(Ap 18:4). Nesse sentido, a compreensão adventista de que todos as demais
denominações cristãs faziam parte de Babilônia os conduziu, desde as primeiras
décadas do movimento, a buscar evangelizar mesmo aqueles que já eram cristãos
praticantes, comunicando a eles o evangelho eterno, em sua pureza bíblica. O
retorno à Bíblia, que tratamos no item anterior, assim como a experiência de
RR, levam a integração ideal entre ensinos bíblicos e vida prática, tornando o
povo de Deus a testemunha para esta época. Qual a relevância da mensagem
adventista em um mundo pós-cristão e secularizado, onde há muitas “verdades”?
Como sempre, as pessoas precisam da salvação, quer cônscias disto ou não. E se
a salvação for oferecida por pessoas que a experimentam de forma substancial,
conquanto não sejam isenta de falhas, tanto maior será seu efeito sobre quem
tiver contato com a mensagem;
• Resgate
e desenvolvimento do pensamento dos pioneiros: o pensamento dos pioneiros
adventistas precisa ser redescoberto. Cada adventista deveria conhecer, à luz
da história do desapontamento, a construção teológica revolucionária que surgiu
após o evento. A partir das propostas iniciais dos primeiros adventistas, a
geração atual deveria prosseguir construindo, eliminando influências teológicas
evangélicas que são incoerentes com a mensagem do remanescente. Alguns parecem
ter urticárias à palavra “pioneiro”, temendo que, com isso, esteja implícito um
idealismo em relação a nossos primeiros teólogos. De fato, os pioneiros do
adventismo possuíam limitações e a história revela algumas delas. Se a
compreensão básica da fé adventista se formou até 1850, alguns pontos
controversos permaneceram por décadas, mostrando que, mesmo entre os pioneiros
do movimento, não havia total unidade de pensamento. Ocorre que muito do
revisionismo liberal que existe dentro do adventismo prefere focar as
divergências, tentando assim justificar que outras divergências mais profundas
na atualidade seriam saudáveis e mesmo necessárias ao adventismo como um todo.
A tese cai por terra quando somos levados a considerar que, ainda divergentes
em questões secundárias, os primeiros partícipes do movimento punham em patamar
indisputável o que consideram como os marcos do adventismo – justamente aquelas
doutrinas que, na atualidade, os liberais costumam questionar com frequência!
Ademais, a compreensão da verdade é sempre progressiva, o que se verifica no
desenvolvimento das doutrinas adventistas. Negar essas doutrinas hoje, sob a
alegação de que compreensão progressiva equivale a espírito progressista,
equivale a agir de má fé! Os progressivos avançam dentro de certas linhas de
trabalho, como no caso dos pioneiros adventistas; os progressistas retrocedem
porque ignoram as linhas de trabalho e as modificam constantemente, em muitos
casos, por orgulho acadêmico. O exemplo vivo disso está entre os mais reputados
estudiosos adventistas do livro de Apocalipse, muitos dos quais vêm abandonando
(sutilmente) o historicismo por outras interpretações mais aceitáveis
academicamente, o que lhes permite publicar em revistas de prestígio e receber
elogios do mundo erudito. Retornando à questão, quando se promove um retorno à
ênfase dos pioneiros, tem-se em mente que o que eles descobriram deve ser posto
como ponto de partida para novas descobertas bíblicas ou aprofundamentos
daquilo que já se aceitou. O ponto é: não podemos nos contentar com o que os
pioneiros disseram. Temos de seguir e avançar, com o mesmo espírito e
metodologia, sempre apaixonados pela verdade bíblica. Especialmente, muitas das
implicações da Verdade revelada precisam ser exploradas, complementando a
proposta teológica que o povo remanescente lançou em seu início;
• Ênfase
na mensagem distintiva do adventismo: não somos evangélicos, se entendermos
o termo da forma genérica como é aplicado no Brasil (ou no contexto
norte-americano, no qual mesmo os evangélicos tradicionais têm uma base mais
filosófica do que bíblica). De fato, os reformadores do século XVI agiram com
coragem ao se apartarem de Roma; contudo, eles não chegaram à uma compreensão
mais acurada, porque não era tarefa simples se libertar da influência
escolástica do romanismo. Os seguidores de Lutero e Calvino mantiveram muitos
de seus erros doutrinários: ainda concebiam Deus como um ser eterno e atemporal
(conceito da filosofia grega completamente estranho à Bíblia), a própria alma
era imortal (outra herança pagã) e a justificação pela fé não passava de um
decreto eterno da parte de Deus (ligada portanto com a predestinação, entendida
como uma escolha soberana de Deus independente da vontade humana). Se muitos
adventistas tradicionais elogiam a pregação dos reformadores é porque
desconhecem o quão pouco bíblica ela era! Evidentemente, os reformadores se
ergueram para defender uma volta às Escrituras, redescobrindo verdades
obliteradas por séculos. Dentro da luz que alcançaram, revelaram fidelidade ao
chamado divino. Aqueles que lhes sucederam não deram continuidade em examinar a
Bíblia. Por outro lado, a chamada reforma radical, de menonitas e anabatistas,
seguiu com mais coerência a mensagem de um retorno às Escrituras, originando o
espírito que depois levaria à formação do movimento mileritas e, por
conseguinte, ao movimento adventista sabatista. A mensagem adventista é tanto o
fruto dessa outra tradição, que detém o melhor dos reformadores, quanto o
resultado de contribuições de outros fiéis das épocas posteriores, como
metodistas e batistas do sétimo dia. Deus despertou indivíduos e grupos ao
longo da História para, finalmente, estabelecer o remanescente dos últimos
dias. A restauração da Verdade não aconteceu de maneira mágica; o processo
exigiu o esforço e a colaboração de homens santos de diversas épocas. O
movimento adventista não possui méritos isolados, porém é grande devedor de
reformadores, puritanos, metodistas, batistas, conexistas, mileritas e muitos
outros. Manter a identidade adventista não significa rejeição a priori de
contribuições de estudiosos evangélicos. Contudo, deveríamos ser seletivos
quanto à teologia e cultura (estilo de culto, gêneros musicais, shows, etc)
evangélicos, julgando-os a partir de nossa compreensão bíblica. Acima de tudo,
já é tempo quando as grandes verdades descobertas e suscitadas pelo estudo dos
cristãos fiéis que constituíram o adventismo devem ser transmitidas ao mundo
com urgência e propriedade. Os adventistas não foram levantados para apresentar
uma versão genérica do evangelho, nem se conformar com o presente século (Rm
12:2). Somos servos do mundo, os seres que mais precisam sentir o peso da
responsabilidade de pregar a Verdade presente (Rm 10:14);
• Participação
integral na missão: são notórios e bem vindos os diversos incentivos à
participação na obra missionária. A promoção dessas atividades, bem como sua
diversidade, são marcas tipicamente adventistas, ainda que estejam
desaparecendo em algumas geografias (especialmente na Europa). Há maravilhosas
oportunidades para quem se sente vocacionado a servir como voluntário, ajudando
em programas sociais e evangelísticos. Entretanto, redescobrir a missão envolve
(a) incorporar conscientemente a missão, (b) refletir biblicamente sobre a
missão e seus métodos e (c) verdadeiro amor pelos pecadores.
Certamente,
se poderiam apresentar medidas complementares para impedir que a adventismo
continue se diluindo. Aliás, o assunto mereceria um livro à parte. A despeito
de nossas limitações de espaço e consequente necessidade de concisão, acredito
que as medidas citadas ajudarão a impedir que nos tornemos esse tipo de sopa
rala que se vê no seio do movimento evangélico. Afinal, Deus despertou um povo
para ser Seu remanescente e não uma denominação cristã qualquer, anunciando
pobremente a salvação em uma esquina.
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