Fonte Revista Veja 27/05/2014 - 08:48
Igreja Católica
Papa deixa ‘porta aberta’ para discutir celibato na Igreja
Durante voo de Tel Aviv para Roma, Francisco ressaltou que aprecia a regra do celibato, mas que a questão não é um dogma de fé, portanto, pode ser discutida
Papa Francisco durante entrevista no voo de retorno a Roma após uma viagem de três dias ao Oriente Médio
(Andrew Medichini/AFP)
O papa Francisco sinalizou nesta terça-feira que está aberto à
discussão sobre o celibato dentro da Igreja Católica, reporta o jornal
espanhol El País. As declarações foram feitas durante uma
entrevista coletiva aos jornalistas que o acompanhavam no voo de volta
de Tel Aviv para Roma, após a primeira visita do papa à Terra Santa. “A
Igreja Católica tem padres casados, católicos gregos, católicos coptas
e no rito oriental. Não é um debate sobre um dogma, mas sobre uma regra
de vida que eu aprecio muito e que é um dom para a Igreja. Por não ser
um dogma de fé, a porta sempre está aberta", disse o papa.
Ao deixar claro seu apreço pelo celibato, o pontífice reafirma uma posição pessoal já presente nos diálogos com o rabino Abraham Skorka, ao longo de 2010, que deram origem ao livro Sobre o Céu e a Terra.
Em um trecho que trata do celibato, Jorge Bergoglio, então arcebispo de
Buenos Aires, diz: “No catolicismo ocidental, o tema é discutido
impulsionado por algumas organizações. Por enquanto, a disciplina do
celibato se mantém firme. Há quem diga, com certo pragmatismo, que
estamos perdendo mão de obra. Se, hipoteticamente, o catolicismo
ocidental revisasse o tema do celibato, acredito que o faria por razões
culturais (como no Oriente), não tanto como opção universal. Por ora,
sou a favor de que se mantenha o celibato, com seus prós e contras,
porque são dez séculos de boas experiências, mais que de falhas”.
A manifestação de Francisco no retorno a Roma ocorre alguns dias após um grupo de 26 mulheres italianas enviarem uma carta
ao sumo pontífice pedindo para ele repensar o veto ao casamento mantido
para os padres. "Caro papa Francisco, nós somos um grupo de mulheres de
todas as regiões da Itália que escrevemos para romper a parede de
silêncio e de indiferença que nos cerca todos os dias. Cada uma de nós
vive, viveu ou gostaria de viver uma relação de amor com um membro do
corpo eclesiástico, por quem somos apaixonadas", afirmam as signatárias.
As mulheres não revelaram suas identidades nem os nomes dos seus
companheiros padres, mas deixaram um número de telefone no final da
carta e pediram "com humildade, que alguma coisa mude, não apenas por
nós, mas também pelo bem de toda a Igreja".
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Em março, o papa defendeu o celibato dos padres ao falar para bispos africanos. Na ocasião, disse que os futuros padres devem ser bem formados desde o seminário "para viver de verdade as exigências do celibato eclesiástico, assim como ter uma relação justa com os bens materiais". Em setembro do ano passado, Pietro Parolin, às vésperas de assumir a Secretaria de Estado e tornar-se o número dois do Vaticano, afirmou que o celibato "não é um dogma da Igreja e pode ser discutido, porque é uma tradição eclesiástica". Especialistas logo alertaram que não havia nada de novo no discurso do futuro secretário. Em 1997, o cardeal e teólogo Joseph Ratzinger, que se tornaria o papa Bento XVI, escreveu um livro, O Sal da Terra, afirmando que o celibato “com certeza não é um dogma". Na época, o alemão Ratzinger era o chefe da Congregação para a Doutrina da Fé.
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O livro João Paulo II - Estou nas Mãos de Deus, que reúne anotações pessoais
do papa, também traz reflexões sobre o tema: "O celibato sacerdotal
é um mistério sobrenatural e, ao mesmo tempo, um dom de Deus, um
carisma, para dedicar-se às coisas do Reino com coração indiviso". Em
seguida, o papa lança a pergunta: "Penso eu assim sobre esse tema? Como
vivo meu celibato? O sacerdócio não é o celibato, mas o celibato
fortalece o sacerdócio. O celibato é comprometer-se para sempre, aqui
está a grandeza do homem".
Abuso sexual – Durante o voo, o papa voltou a
condenar a pedofilia dentro da igreja e revelou que “dentro de poucos
dias” celebrará uma missa na residência de Santa Marta para um pequeno
grupo de vítimas de abuso. “Há seis ou oito pessoas da Alemanha,
Inglaterra e Irlanda. E, em seguida, vou me reunir com o cardeal [Sean Patrick] O'Malley, o presidente da comissão contra os abusos. Mas é isso, temos de seguir em frente. Tolerância zero!", disse.
“Não haverá tratamento preferencial quando se tratar de abuso de
crianças. Esse é um problema muito sério. Quando um padre comete abuso,
ele trai o corpo do Senhor. Um padre deve guiar as crianças pelo caminho
da santidade. E a criança confia nele. Se em vez disso, ele abusa dele
ou dela, é algo muito sério”, acrescentou, revelando ainda que o
Vaticano está investigando três bispos por crimes relacionados a abuso
de menores.
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