Azenilto G. Brito
Quando o líder
religioso norte-americano Jim Jones induziu cerca de 900 pessoas ao suicídio
coletivo na selva da Guiana, autoridades civis e religiosas por todo o mundo
ficaram alarmadas. Em vários lugares cresceu a preocupação com seitas
religiosas fanáticas que levem pessoas a atitudes anti-sociais ou que ponham em
risco a integridade física e mental de seus adeptos.
Para os
católicos e membros de outras igrejas cristãs “regulares”, o problema das
seitas sempre se constituiu um desafio, não só pelos riscos derivados do
fanatismo que acompanha tais cultos, mas pelo proselitismo incansável da maior
parte de tais religiões. Seus agentes especializam-se em arrebanhar membros
dessas corporações em favor de sua causa, tornando-os apóstolos de suas idéias e
instrumentalidade para aumentar-lhes as fileiras em detrimento das igrejas
tradicionais. O problema não passou despercebido do Papa João Paulo II em sua
última visita ao Brasil, que numa de suas alocuções referiu-se ao crescimento
vertiginoso das seitas entre nós como ameaça ao catolicismo brasileiro.
“Maior número de
pessoas do que no suicídio coletivo de Jim Jones já morreu, ou corre risco de
vida, ao se acatarem as teorias de certa corporação religiosa bem ativa no
Brasil e outros países—os ensinos da Sociedade Torre de Vigia de Bíblia e
Tratados, que dirige os trabalhos das Testemunhas de Jeová, com sede em
Brooklyn, Nova Iorque, E.U.A.” A
afirmação é de Azenilto G. Brito, jornalista de Belo Horizonte, autor de O
Desafio da Torre de Vigia, obra de pesquisa da seita das “Testemunhas de
Jeová”.
“Queremos
estabelecer um debate completo e profundo sobre o assunto, pois sendo que as
‘Testemunhas de Jeová’ divulgam literatura de grande tiragem de porta em porta,
contendo artigos que buscam convencer as pessoas a preferirem a morte a tomarem
sangue numa transfusão, o tema já adquire importância social”, explica Brito,
que também escreveu O Desafio das Drogas, com prefácio do Deputado Elias
Murad, já traduzido para o espanhol.
Brito coordenou
recentemente uma manifestação com membros de várias denominações evangélicas em
frente ao Ginásio Mineirinho, onde 20 mil “Testemunhas de Jeová” encerravam um
congresso de três dias. Portavam cartazes e folhetos com mensagens dirigidas
àqueles religiosos, no que chamou “campanha de esclarecimento e conscientização
às vítimas da lavagem cerebral e das distorções dos fatos praticada pela Torre
de Vigia”.
Alega o
pesquisador que “uma seita que leve uma mãe a preferir ver seu filhinho
morrendo sobre um leito hospitalar a permitir que lhe seja aplicado o sangue
que lhe preservaria a vida constitui uma ameaça constante a muitas pessoas por
todo o mundo”. E prossegue: “O número dos que já morreram assim
desnecessariamente em muito superou a marca do fanatismo de Jim Jones”. Também
assinala que entre 1931 e 1952 a organização das “Testemunhas de Jeová” proibia
que seus seguidores se vacinassem, e durante 13 anos, de 1967 até 1980, a mesma
organização proibiu que fossem submetidos a transplantes, tidos como
“canibalismo” em artigo de sua revista Despertai!. “As ‘testemunhas’
eram instruídas a preferirem a cegueira a um transplante de córnea e a morte a
um transplante de rins até que, em 1980, a Sociedade Torre de Vigia finalmente
passou a admitir que as pessoas são ‘ajudadas’ pelos transplantes”, conta
Brito. E indaga: “Por que não recuam também com a proibição das transfusões de
sangue?”
Na nova edição
de seu livro ele reproduz uma carta anônima de dirigentes dentre as próprias
“testemunhas” tentando debater o tema entre seus irmãos e fazer com que sua
liderança mude de atitude. A certa altura da carta, chegam a comentar que a
razão por que a organização Torre de Vigia não recua quanto a esta questão é
por temor das ações judiciais que isso poderia acarretar. Familiares de “Testemunhas
de Jeová” mortas devido a tal proibição poderiam exigir indenização de parte
dessa organização religiosa pois daí ficaria claro que a proibição para
transfusões de sangue não é mais um dogma religioso, tendo sido ensinada por
mero equívoco, como se deu com a questão das vacinas e dos transplantes de
órgãos.
Insistindo em
que não há base bíblica para a proibição das transfusões sangüíneas, “desde que
se estude o livro básico da fé cristã sem a influência da verdadeira ‘lavagem
cerebral’, que a Sociedade Torre de Vigia submete aos quase 5 milhões de
seguidores pelo mundo afora”, Brito—que tem bacharelado em Teologia e mestrado
em ensino de inglês, com cursos nos Estados Unidos—discute em seu livro esta
questão à luz da Medicina e da tradição religiosa de cristãos e judeus. Ele
também demora-se em examinar aspectos históricos da seita, num capítulo
ironicamente intitulado “Histórias Malcontadas Pela Torre de Vigia”. Noutra
seção analisa até se tem fundamento a proibição de uma pessoa celebrar seu aniversário
ou participar de uma festa de Natal, o que também se proíbe aos que se tornam
“Testemunhas de Jeová”.
“A história das
“Testemunhas de Jeová” é uma sucessão de contradições, falsas predições e
distorção dos fatos, o que é ignorado pela grande massa de membros da seita,
pois a sua organização, Sociedade Torre de Vigia, trata de ocultar o melhor que
pode esses fatos embaraçosos de sua história, muitas vezes agindo cinicamente
ao recapitulá-la”, aduz o pesquisador. E exemplifica com a declaração muito
repetida pelas Testemunhas de Jeová em sua abordagem de porta em porta,
especialmente aos sábados e domingos de manhã, de que “muitos anos antes de
1914 a sua organização religiosa já dizia tratar-se aquele de um ‘ano
marcado’”.
Brito explica em
seu livro, com farta documentação na forma de reprodução de páginas de livros
das “testemunhas” fora de circulação, que 1914 era data marcada pelo fundador
da Torre de Vigia, o americano Charles Russell, para ser basicamente o fim
do mundo, com a ascensão dele e seus seguidores para o Reino Ceslestial.
“No entanto, essa organização se empenha por deixar seus membros hoje com a
impressão de que seus líderes anteciparam os marcantes acontecimentos daquele
ano, quando eclodiu a I Guerra Mundial, com todos os seus efeitos no campo
político, social e econômico. Não fica claro que 1914 de fato foi ‘marcado’
para então dar-se o fim da história humana, como esperavam. Assim, ludibriando
os membros sobre este ponto, faz com que saiam por aí repetindo essa
meia-verdade para impressionar as pessoas, e os utiliza como inocentes
repetidores da falsa informação”, declara.
Citando muitos
livros antigos e modernos editados pela própria corporação da Torre de Vigia,
Azenilto Brito indica como Russell acreditava e ensinava que importantes
acontecimentos mundiais estavam todos preditos nas medidas da pirâmide de Gizé
no Egito. Os livros da série Estudos das Escrituras, que o fundador da
organização das Testemunhas de Jeová produziu, traziam esquemas, gráficos e
tabelas com dados sobre as medidas da pirâmide e a extensão de anos proféticos
que representariam. “Ele cria tanto nisso que até seu túmulo, num cemitério
próximo de Pittsburgh, E.U.A., tem uma pequena pirâmide ornamental de concreto
com os símbolos da Torre de Vigia gravados em baixo relevo”, revela o
pesquisador.
Brito continua
historiando que as exóticas teorias sobre a pirâmide egípcia foram totalmente
descartadas pelo sucessor de Russell à frente da organização das Testemunhas de
Jeová, J. F. Rutherford. Este, gostava de criticar os eruditos da “cristandade”
e até chegou a referir-se jocosamente aos doutores em divindade, designados
pela abreviação D.D., dando a entender que as iniciais D.D. sigificariam “dumb
dogs”, ou seja, cães tolos.
Mas parece que a
despeito de seu desprezo pelos teólogos de seu tempo, Rutherford não se revelou
de muito maior capacidade do que eles ao expor as Escrituras. Em 1920 escreveu
um livro chamado Milhões Que Agora Vivem Jamais Morrerão em que
especulava sobre os sentidos dos jubileus festivos de Israel e com base nisso
marcava a data de 1925 para a restauração do mundo, quando Jerusalém seria
tornada a capital do planeta com os heróis bíblicos do passado, Abraão, Isaque,
Davi, Salomão, etc. ressuscitados. “As Testemunhas de Jeová modernas duvidam ter
existido tal livro, pois a Sociedade Torre de Vigia mandou, após 1925, que seus
adeptos os queimassem, pois era um embaraço às suas pretensões de Organização
Teocrática, isto é, diretamente dirigida por Deus. Mas descobri um raro
exemplar ainda disponível na Biblioteca Municipal de S. Paulo. No meu trabalho
de pesquisa reproduzo as págs. 110, 111 e 122 de dita obra, contendo a falsa
profecia de Rutherford sobre a restauração do mundo e volta dos heróis bíblicos
na data de 1925”.
Segundo Brito,
passando o ano de 1925 sem que se cumprissem tais predições, Rutherford mandou
que se construísse em San Diego, Califórnia, uma rica propriedade com fundos da
Sociedade Torre de Vigia para servir de morada aos heróis bíblicos que ao
ressuscitarem ocupariam a casa, o que se daria “em breve”, ele garantia.
Enquanto eles não ressuscitassem, porém, o presidente das “Testemunhas de
Jeová” passou a residir ali por boa parte de cada ano. Dando à ampla casa o
nome hebraico Beth-Sarim, que quer dizer “Casa dos Prícipes”, Rutherford
utilizava-a freqüentemente como uma espécie de “palácio de inverno”, ali
vivendo principescamente até sua morte, em 1942. Ele contava adicionalmente com
dois Rolls-Royce postos à sua disposição, enquanto seus compatriotas amargavam
as durezas dos anos da Depressão, pois os “príncipes” nunca ressuscitaram para
reivindicar sua bela mansão. “Mas uma pergunta surge daí”, continua o autor:
“Sendo que o livro escrito por Rutherford predissera que no mundo restaurado
(em 1925) Jerusalém seria a capital, de onde os heróis bíblicos governariam a
Terra, por que a ‘Casa dos Príncipes’ foi erigida em San Diego, aprazível
cidade costeira da Califórnia, e não na velha capital palestina?”
E para quem
duvidar da veracidade desta história, Brito oferece em O Desafio da Torre de
Vigia a reprodução das págs. 275 e 276 do livro Salvação, editado
pela própria Torre de Vigia em 1939, onde aparece o desenho da propriedade e a
explicação dos objetivos de sua edificação, confirmando o fato.
Azenilto Brito
tenciona promover o seu livro entre as mais diversas corporações cristãs. “Sou
de formação evangélica”, explica, “mas atuo numa entidade interconfessional
onde trabalham harmonicamente católicos e protestantes. No meu escrito busco
esclarecer os fatos sobre esta seita sutil e desafiadora para benefício de
todos os que aceitam a Bíblia como livro básico, sem direcionar o leitor para
nenhuma igreja em particular”. Ele afirma esperar que os católicos leiam e
tirem bom proveito do livro: “Posso afirmar que o seu conteúdo filosófico está
em perfeita consonância com o que reza a tradicional prece do ‘Credo dos
Apóstolos’, proferida cada domingo na missa” e revela ter até feito contato com
um líder católico carismático para que divulgue a obra nesse meio. Quanto a sua
promoção entre os evangélicos, diz estar tranqüilo—“O prefaciador é o conhecido
evangelista Caio Fábio d’Araújo Filho que declara ser o meu livro ‘o mais forte em provas, o mais denso
em argumentos e o mais preciso em dados históricos que já foi escrito no Brasil
a respeito da questão das “Testemunhas de Jeová”’”.
Fonte - O desafio da torre de vigia Pags 110 - 113
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