Rodrigo Silva
Não sou de
maneira nenhuma partidário de Hitler ou das ideias que ele defendeu. Mas
considerando a rara sinceridade com que ele admitiu algumas intenções
de seu projeto e a advertência que nos vem disso, gostaria de começar
esse texto citando um de seus pensamentos ou diria confissões. Ele
disse: “É mais fácil envolver o povo numa grande mentira, do que numa
pequena. Quanto maior a mentira, mais pessoas acreditarão nela… Torne a
mentira grande, simplifique-a, continue afirmando-a, e eventualmente
todos acreditarão nela.” (MeinKampf, 185).
O mesmo
espírito que inspirou Hitler a usar esse método de propagar inverdades
parece estar por detrás de muitos boatos e enganos que surgem,
especialmente, nas mídias sociais. E o Inimigo de Deus não teria
estratégia melhor, senão criar boatos aparentemente favoráveis à Bíblia,
apenas para depois desmentir tudo como puro embuste e, na esteira das
denúncias, lançar descrédito à Palavra de Deus.
Veja que é
coisa muito séria tentar defender a Bíblia com fatos falsos. A própria
idoneidade da Palavra de Deus é posta em questionamento. Disse Jesus:
“Seja, porém, o vosso falar: Sim, sim; Não, não; porque o que passa
disto é de procedência maligna.” Mateus 5:37. É claro que há argumentos
que usamos que são hipóteses, mas ainda assim, elas têm de ser
plausíveis e nunca mentirosas. Mais doído do que ouvir um oponente
defender mal a idéia que combatemos é ouvir um aliado defender mal a
ideia com a qual simpatizamos.
O curioso é que
mesmo com advertências óbvias como estas, vira-e-mexe testemunhamos o
aparecimento de matérias sensacionalistas dizendo num momento que
encontraram as rodas dos carros de Faraó debaixo do Mar Vermelho, noutro
que localizaram os restos de Sodoma e Gomorra debaixo do Mar Morto.
E o campeão
destes boatos sem fundamento é o suposto achado da arca de Noé. Há
tantos que os autores de língua inglesa chegaram a criar um trocadilho
para esses exploradores da arca perdida. Eles ironicamente os chamam de
arcaeólogos, ao invés de arqueólogos!
Ao todo já
relacionei ao relatório mais de 40 supostos achados da arca de Noé e
além de serem todos falsos ou inconclusos, eles têm mais dois pontos em
comum: primeiro que foram todos encontrados por leigos sem nenhuma
formação ou treinamento de arqueologia e segundo, que a maioria deles
convenceram muitas pessoas apesar de apresentarem provas questionáveis e
relatos contraditórios.
Só sei que se
um desses relatos estiver verdadeiro, todos os demais têm de ser falsos,
por mais bem defendidos que tenham sido. A menos, é claro, que existam
várias arcas de Noé ou que a mesma esteja ainda surfando até hoje sob as
geleiras do Ararate porque seus vestígios ora aparecem num canto, ora
aparecem noutro. E todos afirmando sem medo de errar que acharam a
verdadeira arca de Noé!
Um desses
últimos achados se deu há cerca de 5 anos, mas especulações acerca do
mesmo continuam bem firmes na Internet. Afirma-se que um grupo de
chineses e turcos teria encontrado o barco milenar e até feito filmagens
dentro dele. Será verdade?
Eu mesmo
ficaria muito feliz se fosse, mas por honestidade acadêmica e cristã,
sou obrigado a dizer que se trata de mais um engano. Mais um desserviço à
propagação da Palavra de Deus.
Tive a
oportunidade de trocar e-mails e conversar pessoalmente com o Dr.
Randall Price, arqueólogo americano que num primeiro momento teve seu
nome associado ao grupo. Ele não somente negou que aquilo fosse verdade,
mas ainda se disse desapontado com a falta de sinceridade do grupo.
O Dr. Price,
para que todos saibam, chegou a fazer parte da primeira expedição dos
Chineses quando esses lhe mostraram as fotos do achado em 2008. Ele
conseguiu um recurso de cem mil dólares para o projeto, mas em pouco
tempo percebeu que as evidências apresentadas não passavam de uma
fraude.
Em 2009 Dr.
Price e outros especialistas identificaram a caverna e os troncos que os
chineses usaram para produzir o seu “filme”. Na verdade eles nunca
estiveram dentro da arca de Noé!
Aliás, mesmo
sem essa informação, o que eles apresentaram já era por si só digno de
ceticismo. Veja o dilúvio ocorreu há pouco mais de 4 mil anos, logo,
essas madeiras jamais estariam em perfeito estado de conservação
conforme mostra o vídeo. E não adianta dizer que foram preservadas pelo
poder de Deus, pois como arqueólogo posso afirmar que essa não parece
ser a forma de Deus agir. Mesmo os importantes manuscritos do Mar Morto
(achado importantíssimo para comprovar a veracidade textual da Bíblia
Sagrada) foram encontrados em forma fragmentária e alguns completamente
destruídos pela ação do tempo!
Outra coisa que
me chamou a atenção é que nalguns sites o suposto achado dos Chineses é
misturado com fotos de uma estrutura de pedra em forma navicular
localizada em Durupinar. Ora, na verdade o que temos ali é outro falso
achado promulgado desta vez por Ron Wyatt um falecido anestesista do
Tennessee que também vivia “descobrindo” relíquias bíblicas – todas
falsas.
Como se pode
ver, alguns jornalistas nem se deram ao trabalho de verificar que
estavam divulgando dois diferentes “achados” como se fossem a mesma
“descoberta” – uma de Wyatt, outra dos chineses. Aliás, essa estrutura
de pedra de Durupinar que Wyatt disse ter sido confirmada por muitos
como sendo a arca de Noé era na verdade uma formação rochosa comum que
nem fóssil era. Vários geólogos turcos afirmaram isso!
São por coisas
assim que os que creem na Bíblia devem ter sua atenção redobrada no
momento de usar certos argumentos na defesa da fé. Segundo Othon M.
Garcia, “ainda que cometamos um número infinito de erros, só há, na
verdade, do ponto de vista lógico, duas maneiras de errar: raciocinando
mal com dados corretos ou raciocinando bem com dados falsos. (Haverá
certamente uma terceira maneira de errar: raciocinando mal com dados
falsos). O erro pode, portanto, resultar de um vício de forma –
raciocinar mal com dados corretos – ou de matéria – raciocinar bem com
dados falsos.” (Comunicação em prosa moderna. p. 307). De qualquer
forma, o cristão deve evitar esse tipo de argumento. Paul Joseph
Goebbels, ministro das Comunicações de Adolf Hitler, dizia que “Uma
mentira mil vezes repetida se torna uma verdade autenticada”. Para mim,
uma mentira mil vezes repetida continua sendo uma mentira e não devemos
nunca ter parte nela!
Publicado em Novo Tempo
Rodrigo
Silva, escritor, professor, doutor em Teologia, doutor em arqueologia
bíblica, doutorando em arqueologia clássica e apresentador do programa
Evidências.
Leia Mais em: http://www.genizahvirtual.com/2014/03/encontraram-arca-de-noe.html#ixzz2xaAIH7Di
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