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O pecado que trará o fim do mundo
Por: Ricardo Gondim
Percebo
uma zanga generalizada sobre determinados pecados. “O mundo vai de mal a
pior; estamos perto do fim”, alertam. “Mas quais pecados aceleram o fim
do mundo?”, pergunto. “Promiscuidade sexual”, respondem; e ainda
avisam: “Se não acontecer um avivamento puritano, semelhante ao inglês
no tempo da rainha Vitória, vai chover fogo e enxofre”. Insisto; minha
inquietação é grande: “Por que tanta ênfase no pecado sexual?”.
Não vamos falar de uma iniquidade que Deus odeia, ou melhor, que ele abomina? O livro de Provérbios é categórico:
Estas seis coisas aborrece o Senhor, e a sétima a sua alma abomina:
olhos altivos, a língua mentirosa, e mãos que derramam sangue inocente,
e coração que maquina pensamentos viciosos, e pés que se apressam a
correr para o mal, e testemunha falsa que profere mentiras,
e o que semeia contendas entre irmãos – Provérbios 6.16 9. (o grifo é meu).
e o que semeia contendas entre irmãos – Provérbios 6.16 9. (o grifo é meu).
Deus
odeia toda maldade que gera morte, mas detesta, abomina, maledicência,
calúnia, boataria. O Senhor execra a difamação com veemência. Por que
não se combate precisamente o mal que pode desencadear a ira divina? O
nono mandamento da Lei de Deus não deixava dúvida, Javé não tolera quem
semeia suspeita: “Não dirás falso testemunho contra o teu próximo”.
Por que Deus aborrece a maledicência com tanta força?
Porque o maledicente só
desopila o baço quando, insatisfeito em arranhar uma reputação, busca
destruir uma história. O caluniador crava as unhas na vida de pessoas
que admira com ânsia de matar.
Porque o maledicente fuça
a intimidade alheia para suscitar o que não presta. Para isso gosta de
ambientes mal cheirosos. É hiena com fome de carniça. O caluniador se
alimenta de notícias estagnadas. Ele sabe revolver as fossas do passado –
fossas podres. O mundo do caluniador rodopia em frases retalhadas de
eventos que deveriam jazer no mar do esquecimento. Quando retalha
conversas, pinça revelações de contextos íntimos; e joga ao vento com o
intuito de arrasar.
Porque o maledicente se
contenta em sussurrar meias verdades. Ele aumenta, nunca inventa. Sua
especialidade é imaginar. Evita o risco da calúnia com vagas
insinuações. Fantasia, e espalha como fato, o que suspeita. O difamador
não passa de rato. Seus movimentos são ágeis pelos esgotos da dúvida.
Seu mundo necessita de penumbra; suas alucinações não resistem à
luz. Necessita de lusco fusco para que todos fiquem pardos.
Porque o maledicente é
escorregadio. Adora o discurso conservador para se proteger de atos
falhos, de pequenas escorregadelas. É ortodoxo. Gosta de discutir
literalidade; detesta a sua subjetividade. Montado em lógicas
incontestes, evita que outros percebam o desconforto que nutre consigo
mesmo. A fofoca espalhada serve para esconder a alma exangue do
detrator. Como diz José Ingenieros, ele quer empanar “a refutação alheia
para diminuir o contraste com a própria”. Quando sugere a dúvida,
acredita que a sua leviandade diminuirá o discernimento das pessoas.
Por que o maledicente precisa
de cúmplices. Ele só age em quadrilha. Amparado por gente de coração
diminuto, espalha o vírus da notícia imprecisa. Procura não aparecer.
Basta esperar que a informação suspeita se espalhe pela boca rancorosa
de simplórios. A maquinação da maldade não carece de sua supervisão. E
não falta gente baixa. Sobra quem se deleita em assistir ao espetáculo
de uma biografia enxovalhada na sarjeta. Ele se delicia em saber que
outros terminaram o serviço sujo que ele só começou. Desdenha a Bíblia,
que tanto repete: “Não se alegre quando o seu inimigo cair, nem exulte o
seu coração quando ele tropeçar…”.
Porque o maledicente saliva
na iminente derrocada de quem, na verdade, admira. Depois que sabe da
desgraça se refastela. Seu sorriso tem uma satisfação satânica. Ele
deseja o que o outro desfrutava. Seu ódio é proporcional à admiração.
Agora, acredita que não existe mais ninguém acima de si. A língua é
fogo, muitas vezes incandescida pelo inferno. A língua produz um mundo
de iniquidade e só precisa de uma fagulha para incendiar o curso de uma
reputação. Para acabar com alguém, bastam uma breve insinuação, um cenho
franzido, um gesto hesitante.
Porque o maledicente é
dono de uma perfídia maldosa. Ele é mestre nas perguntas capciosas. Sua
intenção é ouvir o segredo e deixar pontos de interrogação no ar:
“Será?”; “Foi assim mesmo?” Para isso, oscila sordidamente entre a
piedade e a detração. Com a mesma língua bendiz a Deus e amaldiçoa a
história de alguém criado à imagem e semelhança do Deus, que ele jura
adorar. Se não consegue destruir a biografia, o testemunho observado
objetivamente, o caluniador questiona as intenções. Gosta de fazer juízo
de valores porque a subjetividade é frágil. Vale-se de seus esgotos
interiores para julgar e sentenciar. Davi pecou, mas teve a graça de
escolher que tipo de punição sofreria. “Prefiro cair nas mãos do Senhor,
pois grande é a sua misericórdia, a cair nas mãos dos homens”. O padre
Antônio Vieira comentou a passagem: “O juízo dos homens é mais temeroso
do que o juízo de Deus; porque Deus julga com entendimento, os homens
julgam com a vontade”.
Porque o maledicente nunca
quer ser justo. Sua verdade nasce da sua antipatia. Indisposto, exerce
um juízo manchado de inveja. Mal discerne que suspeita, dúvida e
sentença veem contaminada com aversão. O acusador não quer saber que
encarna a perigosa serpente do Apocalipse e que terá o mesmo destino.
Porque o maledicente, antes
de apontar o dedo, esquece de Provérbios: As palavras do caluniador são
como petiscos deliciosos; descem saborosos até o íntimo. Como uma
camada de esmalte sobre um vaso de barro, os lábios amistosos podem
ocultar um coração mau. Quem odeia disfarça suas intenções com lábios,
mas no coração abriga a falsidade. Embora a sua conversa seja mansa, não
acredite nele, pois o seu coração está cheio de maldade. Ele pode
fingir e esconder o seu ódio, mas a maldade será exposta em público.
Quem faz uma cova, nela cairá; se alguém rola uma pedra, esta rolará
sobre ele – (26.22-27).
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