Por que se faz festa na
virada do ano? Por que tanta pirotecnia, espumantes e toda aquela
alegria – que, de tão universal e pujante, soa artificial? A pergunta
não me ocorre espontaneamente. Na virada do ano de 2004, dez anos atrás,
quatorze países na Ásia e África choravam seus mais de 115.000 mortos
pela força destrutiva de um tsunami provocado por um terremoto marinho;
eles choravam também os feridos, as casas devastadas e a perda do chão
sob os pés. Também centenas de famílias estavam neste instante chorando a
perda de alguém em um incêndio em Buenos Aires. Também, aqui perto, a
família de um bom amigo meu chorava a perda de seu pai na sala de
cirurgia.
Dez anos se passaram e o
que temos? Ainda choramos os mortos no incêndio da boate Kiss. Ainda
choramos os mortos e os desalojados pelas chuvas no Espírito Santo.
Ainda choramos a empáfia de Renan Calheiros e a classe que ele tão
perfeitamente representa.
Esse tom amargo e algo
melancólico que inspira a pergunta: qual a razão da festa? É para
comemorar que temos mais um ano pela frente? Se for, não contem comigo.
Não consigo comemorar mais um ano aqui. Isso me parece motivo
para lastimar e não para festejar. Claro, porque eu espero outra
realidade, uma realidade definitiva. Uma realidade que meu Deus não
poupou tintas para pintar: Eis que o tabernáculo de Deus está com os
homens, pois com eles habitará, e eles serão o seu povo, e Deus mesmo
estará com eles. Ele enxugará de seus olhos toda lágrima; e não haverá
mais morte, nem haverá mais pranto, nem lamento, nem dor; porque já as
primeiras coisas são passadas (Apocalipse 21:3 e 4).
E, no entanto, essa
realidade ainda está no futuro. Alguém poderia dizer que o melhor seria
descrer e se entregar à euforia, artificial e fomentada pelo álcool que
seja, mas isso não é alternativa. Não, não é para qualquer um que tenha
um dia saboreado o que é a paz que excede todo entendimento e tenha
sentido o calor do abraço desse Deus, que prometeu habitar conosco,
entre nós.
Assim, não quero comemorar
um ano mais nesta realidade. Ela é do jeitinho que nós um dia
escolhemos: a Terra treme – geme como quem está pra dar a luz – o câncer
grassa irrefreável, as pessoas se enganam, o direito é pervertido e a
justiça é retórica; pessoas queridas dizem adeus, situações maravilhosas
terminam. Há fomes, guerras e rumores de guerras. Foi isso que
escolhemos e é a escolha que ratificamos todos os dias quando pedimos
que Deus dê um tempo; quando resolvemos que nossa vontade e impulso são
mais razoáveis do que Sua Palavra. Mas basta! Quero a realidade que Ele
sonhou. Chega de festejar mais um ano por aqui.
Entretanto, se a festa
serve para olhar para trás e ver que até aqui nos ajudou o Senhor e que
estamos um ano mais próximos daquele dia, me deem um rojão. Minha
alegria não será artificial.
Que até aquela realidade prometida possamos ratificar a escolha por ela e que Deus nos guarde dos efeitos desta realidade aqui.
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