O Vaticano escolhe o víés do carisma para retomar a caminhada rumo à liderança global.
No dia 13 de março de 2013, os jornais
do mundo inteiro noticiavam a nomeação de Jorge Mario Bergoglio como o 266ª papa. De
origem argentina, com 76 anos de idade, é o primeiro jesuíta e o primeiro latino-americano a ser eleito papa.
Analisando a reação dos meios
de comunicação a respeito da nomeação do pontífice Francisco, verificou-se uma
forte tendência por parte da mídia em supervalorizar suas habilidades
carismáticas como simplicidade, informalidade e devoção. Examinando acuradamente essa inclinação
midiatica, percebe-se a intenção do Vaticano em querer retomar a sua marcha
rumo à lidernaça global pelo viés do carisma. A espectativa é que essa
ferramenta proporcione-lhe, de forma mais eficaz, o aumento da sua influência
sobre os países e, como consequência, ocorra-lhe a restauração definitiva do
seu domínio global, há muito desejado.
O FENÔMENO CARISMA
A
busca do carisma parece ter sido o fator preponderante na eleição de novo
pontífice. O que parece é que foi uma escolha acertada, pois os meios de
comunicação enfatizaram exatamente isso. No programa é
notícia da redeTV[1],
por exemplo, Leonardo Boff entrevistado por Kenedy Alencar, chegou a afirmar
que o novo pontífice liderará a igreja romana de uma forma diferenciada
especialmente porque a sua política se centralizará no povo e não na
instituição. Isso porque Bergoglio primeiro pediu ao povo que o abençoasse,
fato incomum no primeiro pronunciamento de um papa. Ele ainda destaca as
primeiras atitudes de Bergoglio ao falar de improviso e não discursar em latim.
Atitudes, essas, novas e inesperadas.
Outro
exemplo dessa tendência de prestigiar o novo pontífice com atributos
excepcionais é encontrado no artigo Um
papa que anda a pé publicado no site do Estadão dia 16 de março, por Christian
Carvalho Cruz. O articulista ressalta, citando o teólogo jesuíta Jesus Hortal
da PUC-SP, que Bergoglio “será o papa da linguagem do povo, da proximidade e da
familiaridade”, habilidades extracotidianas num pontificado romano. No
site da BBC Brasil, do dia 15 de março, também se verificou a valorização das habilidades
extracotidianas de Francisco. David Willey, nessa matéria, dá ênfase à recusa do
papa em usar a limusine blindada. Ele preferiu fazer o percurso de ônibus com
os outros cardeais. Ainda é dito que ele pagou a conta do hotel em que ficara hospedado
com dinheiro do próprio bolso. Já no jornal Zero Hora[2], a
ênfase foi na simplicidade dos gestos. Esse jornal até mesmo destaca que essa
simplicidade pode mostrar lições essenciais para o mundo empresarial.
Além
dessas instituições jornalísticas, várias outras também direcionaram sua
atenção às habilidades extracodidiana do novo pontífice. Não resta dúvida que o
carisma se tornou o meio pelo qual o Vaticano deseja mostrar-se ao mundo. Se a
via do carisma for a trilha que a igreja percorrerá daqui para frente, surgem
algumas inquietações que precisam ser observadas.
CARISMA
E SUAS IMPLICAÇÕES TOTALITÁRIAS
Em
primeiro lugar, de acordo com o arrazoado sobre o carisma de Maurizio Bach[3],
existe um objetivo último que se pretende com a utilização desse artifício no processo
político ou religioso. Ele argumenta
que para se caracterisar, por exemplo, uma pessoa genuinamente caristmática é
necessario “por parte de um círculo limitado de pessoas, a
crença nas qualidades extracotidianas do pregador ou na personificação de
novas ideias de valores” (2011, p. 55). É o que presenciamos de forma nítida na
cobertura midiática da eleição de Bergoglio: ênfase exagerada em suas atitudes
carismáticas.
Em
segundo lugar, Bach salienta que o resultado último desse fenômeno é o poder
quase que autoritário, por parte do líder carismático, sobre aqueles que
reconhecem as suas virtudes. Para esse pesquisador, a magia carismática produz “uma
força poderosa capaz de exercer tamanho fascínio sobre as pessoas ...
reforçada ... pela pretensão autoritária de liderança de uma personalidade
considerada extraordinária” (2011, p. 58). Como resultado do fascínio do carisma, os
dominados exercem uma obediência quase que irrestrita ao líder excepcional, fruto
de sua devoção ao absolutismo ou ao extraordinário. Bach assevera ainda que o
“carisma ‘força’ a ‘sujeição’ como consequência da lealdade aos valores,
[se transformando] em um recurso de poder e passa a constituir, ao mesmo tempo,
uma relação de dominação” (2011, p.56).
Diante
disso, é preocupante o ressente fascínio produzido pela mídia em relação ao
carisma do novo papa. Sabendo que a igreja não renunciou em nenhum momento de
sua trajetória política as pretensões de liderança mundial, o discurso
carismático manifestado pelo novo pontífice pode anteceder um comportamento
totalitário por parte do Vaticano, que seria um processo natural do fenômeno
carisma. Assim como ocorreu com indivíduos emblemáticos da história como Hitler,
Lenin, Napoleão Bonaparte e muitos outros, o início da caminhada política deles
foi marcado por uma forte manifestação carismática, arrebatadora e
extracotidiana, semelhante às manifestadas nas ações do novo papa. Porém, ao
crescer o poder de influência deles sobre as massas, o que era carisma resultou
em totalitarismo exacerbado.
O
VATICANO E TOTALITARISMO
Por
mais que possa parecer exagero, no século passado, alguns analistas religiosos
já denunciavam as diversas tentativas por parte do Vaticano em retomar o
domínio totalitário mundial perdido nos períodos da Reforma Protestante,
Renascimento e, sobretudo, na Revolução Francesa. Desde o Tratado de Latrão[4]
assinado pelo Vaticano e pelo governo italiano em 11 de fevereiro de 1929, no
qual Mussolini restaura certos poderes à Igreja Romana, os pontífices romanos subsequentes
deram início a marcha de recuperação do poderio perdido.
O
interessante é que essa retomada da caminhada rumo à liderança mundial, foi, de
forma pioneira, denunciada pela escritora norte-americana Ellen Gold White, há
mais de cem anos. No livro O Grande
Conflito[5],
sua obra mais difundida, ela assevera de forma contundente que o Vaticano fará
de tudo para recuperar o domínio exercido no passado. Pois faz parte da
política da igreja assumir o caráter que melhor cumpra o seu propósito.
Dentre
às várias denuncias que essa escritora faz, a que se refere aos trejeitos piedosos
(marca do fenômeno carisma) apresentados pela Igreja Romana, hoje, como meio de
atingir os seus objetivos é de suma relevância. White afirma que “a Igreja de
Roma apresenta hoje ao mundo uma fronte serena, cobrindo de justificações o
registro de suas horríveis crueldades. Vestiu-se com roupagens de aspecto
cristão porém, não mudou”. Mais na frente ela assevera que “todos os princípios
formulados pelo papado em épocas passadas, existem ainda hoje. As doutrinas
inventadas nas tenebrosas eras ainda são mantidas. Ninguém se deve iludir” (2007,
p. 571). Ela ainda declarou veementemente que o Vaticano “emprega todo
expediente para estender a influência e aumentar o poderio, preparando-se para
um conflito feroz e decidido a fim de readquirir o domínio do mundo e
restabelecer a perseguição” (2007, p. 566).
Portanto,
diante do que foi exposto, infere-se que a escolha do carisma por parte do
Vaticano como meio de recuperar o prestígio perdido requer um olhar mais
inquiridor sobre as implicações mundiais desse comportamento. Não seria mal
observar com mais rigor os passos que a igreja romana vem tomando nesses últimos
dias. Pois os efeitos naturais do fenômeno carisma é conduzir quem quer que o
utilize ao fortalecimento do seu poder sobre as massas. Redundando como
consequência, num domínio totalitário. Será esse o real objetivo da Igreja
Romana? Hoje, pode parecer fundamentalista raciocinar dessa maneira. Porém a
resposta eficaz e segura para essa pergunta, só futuro nos revelará.
2013 © Wanderson Vieira da Silva – wandervs2000@hotmail.com
2013 © Wanderson Vieira da Silva – wandervs2000@hotmail.com
[1]
Essa entrevista foi veiculada no ar no dia 17 de março às 00:30hs.
[2]
Sâmia Frantz. Propostas para
Igreja Católica sinalizam o lado gestor do papa Francisco. Zero Hora, 16/03/2013.
[3] Carisma e Racionalismo na Sociologia de Max Weber:In
Revista
de Sociologia & Antropologia, v.01.01: 51 – 70, 2011 (http://revistappgsa.ifcs.ufrj.br)
[4]
MOORE, Marvin. Apocalipse 13: isso
poderia realmente acontecer?. 1 ed. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2013,
p. 57.
[5]
WHITE, Ellen G. O grande conflito. 1
ed. Tatuí: Casa Publicadora Brasileira, 2007.
Fonte A Voz do Profeta
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